A arte de servir

Por Anna Telles

Ajudar, consertar e servir representam três maneiras diferentes de ver a vida.
Quando você ajuda, você vê a vida como fraca.
Quando você conserta, vê a vida como quebrada.
Quando serve, você vê a vida como completa.

~ Dra. Rachel Naomi Remen

Há uma diferença sutil, mas profunda, entre ajudar, consertar e servir.
Ajudar, muitas vezes, surge do impulso generoso da personalidade.
Desejamos ser úteis, aliviar o sofrimento, estender a mão.
Mas, se o impulso não vier do silêncio interior, pode alimentar a ideia de que somos fortes diante da fraqueza do outro.
Sem perceber, colocamos o outro abaixo de nós, e aquilo que parecia um gesto de amor se torna um gesto de controle.

Consertar é ainda mais delicado.
É como se víssemos o outro como algo incompleto, quebrado, e assumíssemos para nós a tarefa de moldá-lo novamente.
Mas quem somos nós para saber o que precisa ser mudado na jornada do outro?
A vida, em sua sabedoria, opera mistérios que a mente não alcança.

Já o serviço…
O serviço não nasce da vontade.
Ele é uma resposta, não uma decisão.
Não se move por urgência, nem por desejo de agradar.
É o espírito que reconhece o espírito.
É a luz que se curva diante da luz, mesmo quando ela parece apagada.

Servir é reconhecer que há algo inteiro em cada ser, mesmo em meio ao caos.
É confiar que a vida está conduzindo todos os processos, inclusive os que não compreendemos.
E que nosso papel, às vezes, é apenas esse: estar presente.
Sem intervir.
Sem conduzir.
Sustentar, em silêncio, a fé na cura que já está em curso.

Nem sempre é fácil.
Às vezes, servir é só sentar ao lado.
Não tocar.
Não nomear.
Apenas sustentar o espaço onde o outro pode, enfim, respirar.

No verdadeiro serviço, não se oferece apenas o que é luminoso.
Também serve a dor atravessada, a experiência difícil, o que não sabemos explicar.
A humildade serve.
A escuta serve.
Até as feridas, quando atravessadas, se tornam canais de compaixão.

O serviço não pede retorno.
Não deseja reconhecimento.
Não precisa de resposta.
Ele apenas se dá.
E ao se dar, realiza algo que não pertence a quem age.
É obra da vida.

É nesse espaço silencioso que o cuidado verdadeiro pode nascer.
Não como um ideal.
Mas como consequência natural de uma consciência que já compreendeu:
não há separação.
O outro não está fora.
A dor do outro é parte do corpo maior ao qual todos pertencemos.
E assim, cuidar do outro é cuidar da própria vida.
Servir ao outro é servir à totalidade.
Uma ação que brota da unidade e se move sem buscar nada para si.

Mas mesmo esse impulso de servir deve ser atravessado com humildade.
Porque é fácil confundir necessidade de ser útil com chamado real.
É fácil desejar servir e acabar aprisionando o outro em nossas ideias do que é melhor.

Por isso, o serviço verdadeiro começa dentro.
É ali que a vontade precisa se aquietar.
Ali que as intenções precisam ser equilibradas no silêncio.
E se, em algum momento, descobrirmos que estávamos agindo por ego, por carência, por desejo de sermos amados, não devemos julgar.
Mas agradecer pela chance de ver.
Porque o erro visto com sinceridade vira degrau para a humildade.

A humildade é a porta de entrada para o verdadeiro serviço.
Não é com nossas qualidades que servimos.
É com o que somos.
Com tudo o que já fomos.
Com o que ainda não sabemos ser.
O mundo precisa de ações.
Mas também precisa de presenças.
Presenças que sustentem o invisível.
Que orem sem palavras.
Que caminhem sem querer conduzir.
Que saibam desaparecer quando não forem mais necessárias.
Esse é o caminho do servidor.
Aquele que não deseja ajudar nem consertar.
Mas simplesmente estar a serviço.
Com o coração em paz.
E confiar que isso já é o suficiente.

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